Como um contrato de 1874 mudou para sempre a história de Blumenau e a região do Vale do Itajaí 5d4l6y
Nesta quarta-feira, 4, é comemorado os 150 anos da “Grande Imigração Italiana” no Brasil, que teve berço na região 6f25x
Há 150 anos, milhares de italianos e tiroleses de língua italiana desembarcaram em Santa Catarina, impulsionados pelo movimento conhecido como “Grande Imigração Italiana”. Diferente dos fluxos anteriores, como o da Colônia Nova Itália, criada em 1836 em São João Batista, essa foi uma migração em massa, planejada pelo governo para ocupar áreas remotas e suprir a demanda por mão de obra.
Blumenau, na época colônia, recebeu esses imigrantes ainda em 1875, um ano depois da do contrato Caetano Pinto, um documento de 1874 que autorizou a vinda de 100 mil europeus para o Brasil, inclusive da região norte da Itália.
Contudo, outra cidade no Vale do Itajaí é considerada o berço da grande imigração. Foi em Brusque — então chamada Colônia Itajahy — que chegaram os primeiros 108 italianos e tiroleses, em 4 de junho de 1875. Nos anos seguintes, milhares vieram com apoio do Estado. O território abrangia Guabiruba, Botuverá, Nova Trento e parte de Gaspar. Já em Blumenau, a chegada foi alguns meses mais tarde, mais precisamente em 15 de agosto daquele ano.

Conforme o pesquisador Andrey José Taffner Fraga, que é coordenador dos Círculos Trentinos em Santa Catarina e no Paraná, e membro da comissão estadual para os 150 anos da Grande Imigração Italiana, a maioria desses imigrantes era formada por trentinos, território que pertencia, na época, ao Império Austro-Húngaro, além dos venetos e lombardos.
Conhecidos como trentinos, os “tiroleses de língua italiana” são tiroleses, da região do Trentino-Alto Ádige ou Tirol do Sul. Em suas pesquisas, a professora, pesquisadora e escritora Rosemari Glatz utiliza a expressão “imigrantes austríaco-tiroleses de língua italiana (trentinos)” para denominar os imigrantes com aporte austríaco e “imigrantes italianos” para designar os imigrantes que ingressaram com aporte da Itália. O Tirol do Sul pertencia ao Império Austro-Húngaro na época, e não integrava o território do Reino da Itália, instituído na unificação de 1861.
Existe um debate historiográfico sobre como categorizar da melhor forma os trentinos imigrantes: como italianos ou austríacos. “Eles eram de fala e cultura italianas e eram chamados de trentinos antes daquela época”, defende o sociólogo e doutor em história Renzo Maria Grosselli, em entrevista ao escritor Saulo Adami na minissérie Fratelli Trentini.
“Eram tiroleses, mas de língua e cultura italiana, e esses imigrantes, juntamente com os vênetos e os lombardos, deram início à ocupação dos territórios que, na ocasião, ficavam na periferia da colônia Blumenau”, esclarece Andrey.
Entretanto, ao longo da história, a cultura italiana trazida por esses imigrantes mudaram para sempre o Vale do Itajaí. O pesquisador ressalta que, a partir dali, surgiram cidades na região, como Rio dos Cedros, Rodeio, Ascurra, Apiúna e Luiz Alves. “Depois, por meio da migração interna, esses imigrantes e os descendentes deles chegaram a toda a região do Alto Vale do Itajaí e a outras cidades do Médio Vale”, detalha.

O contrato de Caetano Pinto 594z4
Na época, o Império planejava povoar o vasto território brasileiro com imigração europeia. As primeiras tentativas datavam ainda da década de 1810, com a vinda da Coroa Portuguesa ao Brasil, sem grande sucesso.
Convencer os europeus era tarefa difícil também nas décadas de 1820 e 1830, pós-independência. A maior parte da população europeia disposta a deixar o continente rumo à América costumava imigrar para os Estados Unidos. O tráfico de escravos foi ilegalizado com a Lei Eusébio de Queirós, em 1850. A ilegalização não impediu totalmente, na prática, o comércio de escravizados, mas a imigração começava a se tornar mais urgente para os latifundiários, especialmente os cafeicultores do Sudeste.
A partir de 1855, o governo imperial, em parceria com os governos provinciais, começou a aplicar incentivos aos grandes fazendeiros de café que conseguissem trazer imigrantes ao Brasil, principalmente ao Sudeste. Contudo, o fato de ser um país ainda escravocrata desanimava os potenciais imigrantes, que não chegaram em grande número. Sem garantias reais de que trabalhariam nas grandes fazendas sem ar por escravidão ou condições análogas, outros destinos eram mais atrativos.

O caso do Sul era diferente do Sudeste, onde as grandes fazendas de café eram muito fortes. No Sul, a ideia não tinha foco na importação de mão de obra para trabalhar nas grandes fazendas, como em São Paulo, por exemplo. A questão a ser solucionada era a ocupação e a colonização de território não explorado ou pouco explorado. O Vale do Itajaí era exemplo dessa necessidade.
Na intenção de iniciar uma onda migratória sem as frustrações das décadas anteriores, o Império do Brasil e o empresário Joaquim Caetano Pinto Júnior am o decreto 5.663 em 17 de junho de 1874. É o que ficou conhecido como contrato Caetano Pinto.
Em resumo, Caetano Pinto comprometia-se a trazer 100 mil imigrantes ao Brasil num prazo de dez anos. As nacionalidades eram especificadas no contrato: alemães, austríacos, suíços, italianos do norte, bascos, belgas, suecos, dinamarqueses e ses. Precisavam ser “agricultores, sadios, laboriosos e moralizados, nunca menores de 2 anos, nem maiores de 45”, salvo se fossem chefes de família. Desses imigrantes, 20% poderiam pertencer a outras profissões.
Foi nesse contexto que se iniciou a Grande Imigração Italiana na região do Vale do Itajaí, um ano após a do contrato Caetano Pinto.
Perfil dos imigrantes 296a3v
Andrey explica que os primeiros imigrantes tinham como pilares a família, a religião e o trabalho, que inicialmente era baseado na agricultura. Ao longo da história, muitos se tornaram também grandes industriais e comerciantes. “Uma contribuição importantíssima que eles deram foi o desenvolvimento de cooperativas para negociação dos produtos agrícolas”, aponta.
O pesquisador destaca que a cooperativa pioneira surgiu em Rio dos Cedros; depois surgiram outras em Rodeio, Ascurra e em algumas localidades. Nessas cooperativas, as famílias dos imigrantes e seus descendentes se reuniam e negociavam a produção diretamente com os consumidores, inclusive com os mercados europeus. O costume possibilitou, segundo ele, um salto de desenvolvimento muito grande, além de deixar uma história de contribuição no cooperativismo.
Italianos marcam toda a região 4y3y2l

Andrey ressalta que a presença italiana pode ser percebida em diversas cidades de Santa Catarina. “É uma presença que vai do Oeste ao Litoral. Especificamente, na nossa região, pensando no território da antiga Colônia Blumenau, a presença italiana está em praticamente todas as cidades, inclusive na antiga sede, onde há uma presença italiana que se organiza em um movimento associativista muito grande”, explica.
Ao observar as cidades no entorno de Blumenau e indo um pouco além, como em municípios do Alto Vale, território da antiga colônia, o pesquisador destaca que a cultura italiana está mais em evidência em cidades como Rio dos Cedros, Rodeio, Ascurra e Luiz Alves.
“Mas não somente nessas, outras também mantêm muito da tradição e da cultura italianas, como Doutor Pedrinho, Rio do Oeste, Laurentino. Enfim, são diversas as cidades do território da antiga Colônia de Blumenau que preservam muito da cultura italiana e que deixam essa cultura em evidência”, completa.
Em Blumenau, Andrey explica que a cultura italiana se manifesta por meio do associativismo. “O principal expoente é, sem dúvidas, o Lira Circolo Italiano. Existem outras associações, como a Associação Vêneta, a Lega Lombarda, o Circolo Trentino. Mas é o Lira Circolo Italiano que congrega todos os movimentos e, por meio desse associativismo, surgiu a Festitália, que é uma das maiores festas italianas do estado e que sempre melhora, sempre traz novidades”, lista o pesquisador. Além disso, por meio do Lira Circolo Italiano, há o Coral Fratelli del Circolo. O grupo se apresenta em toda Santa Catarina e em outras regiões do país.
O pesquisador, que atualmente coordena os Círculos Trentinos em SC e no PR , destaca que há 27 desses círculos espalhados pelo estado, de São Miguel do Oeste a Florianópolis. “Além dos Círculos Trentinos, existem também as Famílias Trentinas, as Associações Vênetas, Lombardas, os círculos italianos em geral. Todas essas associações mantêm vivo o idioma, o folclore, as tradições”, cita.
Para além do associativismo, a cultura se mantém forte por meio dos corais ou grupos folclóricos. Essas entidades, segundo ele, também têm se voltado a parcerias com a Itália, promovendo intercâmbios culturais, acadêmicos e empresariais.
Em Blumenau, por meio do Lira Circolo Italiano, há o Coral Fratelli del Circolo. O grupo se apresenta em toda Santa Catarina e em outras regiões do país.
“São muitos que buscam o aprimoramento acadêmico, bolsas de estudo e relações comerciais com a Itália. Isso mostra que a organização italiana em Santa Catarina evoluiu, mas continua baseada na forte tradição associativa”, conclui.
Cultura italiana em Blumenau 6c222h
Blumenau, que abriga uma expressiva comunidade de descendentes de italianos, ainda preserva traços profundos dessa herança. “Através das famílias de descendência italiana que moram em Blumenau — e não são poucas —, ainda se mantém inclusive o dialeto italiano, em suas variações”, afirma o pesquisador.
Além das manifestações culturais que serão realizadas ao longo do ano, Blumenau conta com exemplos históricos da contribuição italiana. Andrey cita, por exemplo, a família de José Tafner, que deixou um legado significativo na educação e na cultura da cidade — um reflexo de muitas outras famílias que marcaram os mais diversos campos profissionais e intelectuais, tornando-se parte indissociável da identidade blumenauense.
A marca dos 150 anos da grande imigração italiana ao Brasil está sendo celebrada em Blumenau com uma série de ações que reforçam a presença viva da cultura italiana na cidade. Segundo o pesquisador Andrey Taffner, são justamente essas iniciativas — como o desfile regional temático e projetos voltados à preservação da língua italiana — que se tornam marcos importantes da manutenção da italianidade no município.
A atração faz parte da 30ª edição da Festitália, que será realizado em dois setores do Parque Vila Germânica. O evento é organizado pelo Lira Circolo Italiano e acontece de quinta-feira, 12, a domingo, 15, na primeira semana e de quarta-feira, 18, domingo, 22, na segunda semana. Aos sábados, domingos e no feriado do dia 19 de junho a entrada é gratuita até às 18h.

Livro comemorativo 3p6n40
A história da grande imigração está presente no livro “150 anos da grande imigração italiana em Santa Catarina”, que será apresentado nesta quarta-feira, 4, na Alesc, em Florianópolis. Já nesta quinta, 5, o livro será lançado no auditório Dr. Germano Hoffmann, Bloco F, do Centro Universitário de Brusque (Unifebe). A obra foi editada pela Editora da Unifebe.
Organizado por Andrey, a obra reuniu pesquisadores da imigração italiana de todas as regiões do estado, visando fornecer um panorama completo sobre a presença italiana em Santa Catarina. A obra foi um dos projetos abraços pela Comissão estadual dos festejos dos 150 anos da grande imigração italiana no estado.
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